O ano de 2022 parece se iniciar com uma nova discussão tributária para os contribuintes. Isso porque, após a aprovação do Projeto de Lei Complementar n. 32/2021 pelo Congresso, a grande expectativa era que a sanção presidencial ocorresse até 31 de dezembro de 2021. Se isso tivesse acontecido, não restaria dúvidas sobre os efeitos da Lei já para 2022. No entanto, não é o que aconteceu.
Explico melhor!
Inicialmente, em 24 de fevereiro de 2021, o STF decidiu que o Estado de destino de operações e prestações interestaduais com consumidor final não contribuinte do imposto — competente para tanto por força da Emenda Constitucional 87/2015 — só pode cobrar o Difal após a disciplina da matéria por lei complementar (ADI 5.469 e RE 1.287.019). No entanto, visando a proteger os cofres estaduais, modulou os efeitos dessa decisão, determinando que só se aplique a partir de janeiro de 2022 e que retroaja apenas em favor das empresas com ações judiciais em curso na data do julgamento.
Imediatamente, iniciou-se as movimentações no Projeto de Lei Complementar n. 32/2021, que trata por alterar a Lei Complementar n. 87/1996, especialmente para regulamentar a cobrança do Imposto sobre
Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto.
Esse projeto tramitou regularmente e foi aprovado pelo Congresso. No entanto, o referido projeto não foi sancionado pela Presidência da República até 31/12/2021.
O artigo 3º do Projeto de Lei n. 32/2021 estabelece que a LC entra em vigor na data de sua publicação, observado, quanto à produção de efeitos, o disposto na alínea c do inciso III do caput do art. 150 da Constituição Federal.
Esse artigo, basicamente quer dizer que para a Lei Complementar entrar em vigor, ela deve obedecer os princípios tributários da anterioridade anual e nonagesimal. Ou seja, além dos 90 dias de vacatio legis, a cobrança do tributo deveria observar a virada de exercício anual para legitimar a exigibilidade do tributo, o que aconteceria somente em 2023, vez que não foi sancionada em 2021 pelo Presidente da República.
O princípio da anterioridade, em ambos os casos, é consagrado pelo STF como cláusula pétrea, e, em última análise, se justifica na garantia da segurança jurídica, evitando que o patrimônio do contribuinte seja prejudicado pela ingerência estatal.
Como o Convênio ICMS 93/2015, que tratava sobre a cobrança de Difal do ICMS, foi julgado como inconstitucional pelo STF, na prática, a Lei instituiu uma nova tributação, fazendo com que fosse obrigatória a observância do princípio da anterioridade anual e nonagesimal, sob pena de afronta à Constituição Federal (art. 150, inciso III, alínea “b” e “c”).
Segundo Christian Luiz Floriani Stafin, sócio da Stafin Advogados, “o entendimento empregado pelo STF, especialmente dos relatores do RE 1287019 e ADI 5469, foi pela inconstitucionalidade da aplicação da nova sistemática sem a edição de lei complementar para regulamentar a EC 87, e que, os Estados e o Distrito Federal, ao disciplinarem a matéria por um convênio no Confaz, acabaram por usurpar a competência da União, a quem cabe editar norma geral acerca do tema. Logo, não existia o dever de tributar, porque o convênio era inconstitucional, e por esse motivo, nunca chegou a instituir um tributo devido. Logo, a submissão da Lei ao princípio da anterioridade anual e nonagesimal é requisito indispensável para legitimar o tributo”.
O contribuinte, se entender ser cobrado indevidamente pelo referido tributo, poderá discutir a ilegalidade da cobrança e apontar afronta direta à Constituição Federal.